Nos últimos anos, a Turquia vem se destacando como uma das principais potências emergentes em energia renovável, atraindo a atenção internacional por suas metas ousadas e investimentos bilionários. Localizada em posição estratégica entre Europa, Ásia e Oriente Médio, a nação de 85 milhões de habitantes busca reduzir sua dependência de combustíveis fósseis importados — que sempre foram um dos pontos vulneráveis de sua economia — e transformar-se em um exportador líquido de energia limpa.
O presidente Recep Tayyip Erdogan anunciou, em 2024, um plano que pretende revolucionar o setor energético: atingir 120 mil megawatts (MW) em capacidade solar e eólica até 2035, com um investimento de aproximadamente US$ 80 bilhões. O objetivo é reduzir drasticamente a dependência do gás natural importado, diversificar a matriz energética e posicionar o país como líder regional em energia sustentável.
1.1 Crescimento acelerado da energia solar e eólica
A Turquia inaugurou, nos últimos anos, dezenas de novas usinas solares e eólicas em diferentes regiões, desde a Anatólia Central até áreas costeiras no Mar Egeu e no Mar Negro. O país dobrou sua capacidade solar em apenas dois anos e meio, ultrapassando 19,6 GW em 2024, o que representa mais de 10% de toda a sua capacidade elétrica instalada.
Já a energia eólica também avança rapidamente, com parques modernos construídos em áreas estratégicas de vento constante, como Esmirna e Balıkesir. Somadas, as fontes solar e eólica representam cerca de 30% da eletricidade gerada mensalmente em 2025, superando pela primeira vez o gás natural.
1.2 Renováveis já representam mais da metade da geração
Um marco histórico ocorreu em 2024: mais de 53% da eletricidade turca foi gerada a partir de fontes renováveis (solar, eólica, hidrelétrica e geotérmica), ultrapassando pela primeira vez a produção fóssil. Isso coloca a Turquia acima da média mundial e europeia no uso de fontes limpas.
1.3 Meta para 2035
Com o plano de expansão, a meta é quadruplicar a capacidade solar e eólica até 2035. Serão realizados leilões anuais de 2 GW para novos projetos, acompanhados de investimentos pesados em transmissão e armazenamento. Erdogan anunciou também um corredor de alta tensão de 40 GW para integrar as novas usinas ao sistema elétrico.
2. Produção local: motor da indústria nacional
2.1 Nacionalização da cadeia produtiva
Uma das estratégias centrais da Turquia é incentivar a produção local de equipamentos solares e eólicos. Hoje, mais de 70% dos componentes já são fabricados no país, incluindo turbinas, torres e módulos fotovoltaicos. Essa política reduz a dependência de importações, gera empregos industriais e fortalece a balança comercial.
2.2 Incentivos governamentais
Em julho de 2024, Erdogan anunciou um pacote de US$ 30 bilhões em incentivos para setores estratégicos, com foco em:
- Fábricas de células e módulos solares (até 15 GW de capacidade de produção local).
- Indústria de componentes eólicos, incluindo pás e geradores.
- Produção de baterias e veículos elétricos, com apoio de empresas internacionais como a chinesa BYD, que já confirmou investimentos na Turquia.
Essas medidas reforçam o papel da Turquia como hub de inovação e produção de energia renovável, não apenas para consumo interno, mas também para exportação.
3. Parcerias e projetos internacionais
3.1 Cooperação com países vizinhos
A Turquia tem firmado parcerias estratégicas com nações como a Líbia, que busca diversificar sua economia dependente do petróleo utilizando o know-how turco em energia solar e eólica. Além disso, acordos com países europeus e asiáticos fortalecem a posição da Turquia como fornecedor de tecnologia e energia.
3.2 Apoio financeiro internacional
O Banco Mundial assinou, em 2024, um programa de US$ 1 bilhão para impulsionar a energia solar distribuída na Turquia e fomentar projetos de armazenamento em larga escala. Organismos multilaterais e investidores privados também têm olhado para o país como mercado de alto potencial.
4. Geotermia: a joia escondida da matriz turca
4.1 Quarto maior produtor do mundo
Além de solar e eólica, a Turquia é um gigante na energia geotérmica. O país ocupa o quarto lugar no ranking mundial, atrás apenas de EUA, Indonésia e Filipinas. O potencial decorre da localização em uma região de intensa atividade tectônica, com abundância de fontes termais e reservas subterrâneas de calor.
4.2 Projetos híbridos inovadores
Entre os destaques, está a usina de Kuyucak, que combina geração geotérmica com energia solar, aumentando a eficiência e estabilidade da produção. Outro projeto notável é o de Pamukören, em Aydın, que também integra múltiplas fontes renováveis.
Esse modelo híbrido permite maximizar recursos naturais e garantir estabilidade no fornecimento, já que a geotermia fornece energia constante, enquanto a solar e a eólica variam com clima e sazonalidade.
5. Energia solar aplicada à agricultura
A inovação não se restringe às grandes usinas. A Turquia tem investido em sistemas agrivoltaicos, que combinam painéis solares com atividades agrícolas. Assim, agricultores podem cultivar alimentos entre as fileiras de painéis, aproveitando a sombra parcial para reduzir a evaporação da água, enquanto geram energia limpa.
Esses projetos têm sido especialmente relevantes em regiões semiáridas da Anatólia, onde o uso eficiente da água é vital. Para os agricultores, significa acesso a energia limpa gratuita, redução de custos e aumento da resiliência às mudanças climáticas.
6. Impactos econômicos e sociais
6.1 Redução da dependência externa
Atualmente, cerca de 75% da energia primária consumida na Turquia é importada, principalmente petróleo e gás natural. Esse quadro gera vulnerabilidade às flutuações internacionais e pressiona a balança comercial. A expansão renovável busca reduzir drasticamente essa dependência até 2035.
6.2 Criação de empregos
Segundo estimativas, os investimentos em energia solar e eólica podem criar mais de 500 mil empregos diretos e indiretos na próxima década, em setores como construção, manutenção, logística e fabricação de equipamentos.
6.3 Desenvolvimento regional
Muitas das novas usinas estão sendo construídas em áreas menos desenvolvidas do interior, estimulando economias locais, infraestrutura e oportunidades para jovens profissionais.
7. Desafios da transição energética
Apesar dos avanços impressionantes, a Turquia enfrenta obstáculos importantes:
- Infraestrutura de transmissão: a rede elétrica precisa ser modernizada e expandida para absorver a nova capacidade.
- Processos burocráticos: embora estejam sendo simplificados, o tempo de licenciamento ainda pode atrasar projetos.
- Dependência de fósseis: o carvão ainda representa mais de 35% da geração elétrica, exigindo esforços maiores de substituição.
- Investimentos contínuos: alcançar 120 GW até 2035 exigirá estabilidade política, econômica e a atração constante de capital privado.
8. Perspectivas futuras
Com quase 90% dos novos projetos energéticos planejados vindos de fontes renováveis (solar, eólica, geotérmica e nuclear de baixa emissão), a Turquia está no caminho de se tornar um modelo global de transição energética em mercados emergentes.
A visão estratégica é clara:
- Ampliar massivamente a energia solar e eólica.
- Modernizar a rede elétrica com corredores de transmissão de 40 GW.
- Incentivar a produção local e fortalecer a indústria nacional.
- Expandir parcerias internacionais e exportar tecnologia limpa.
Conclusão
A Turquia demonstra, com números e projetos concretos, que está determinada a se tornar uma potência energética sustentável. O país já produz mais da metade de sua eletricidade a partir de fontes renováveis, investe pesadamente em solar, eólica e geotérmica, e mira no horizonte de 2035 para consolidar sua independência energética.
O desafio não é pequeno: serão necessários bilhões de dólares em investimentos, modernização de infraestrutura e políticas estáveis para garantir a execução dos planos. Ainda assim, a trajetória até aqui mostra um país com capacidade de execução e visão estratégica para liderar a revolução energética do século XXI na sua região.